9.6.04

Tenho sangue de circo e de ciganos, suspeito desde pequena. A hiper-frouxidão que de vez em quando me deixa com os ossos soltos dentro do corpo e a intuição maluca que me proporciona estados de estou-passada.
Ontem fui de bicicleta cortar o cabelo e cheguei, por algum motivo, 30 minutos adiantada. Pensando nas terríveis revistas do cabeleireiro, comecei a andar a esmo por Botafogo... parei no cruzamento da São João Batista com a Mena Barreto, pensando que aquela galeria de arte na Paulo Barreto só abria às 4, e provavelmente só para os ricos. Então minhas opções eram o Cemitério São João Batista, que acho calmo e silencioso, além de ter já sepultado um amor lá na época do pré-vestibular, que era lá perto, e também fechou, que nem meu colégio; e a Videolocadora de rico acervo, que também deve fechar logo logo com a concorrência das malditas Blockbuster. A vantagem do Cemitério era não ter que voltar para devolver nada lá no dia seguinte (ou nunca); mas de alguma forma, eu não queria parecer uma gotiquinha imbecil que vai entrando no local de dor dos outros como turista (se bem que meu avô está lá, em algum lugar). Isso não importou naquele dia, há tanto tempo; eu entrei inclusive de walkman ligado, sob os olhares do porteiro (ou coveiro), com uma fita gravada dos clipes da MTV na qual uma das músicas era "2wicky", (Hooverphonic) - mas isto era porque eu não estava em condições de me importar.
Então, me lembrei daquele filme que vinha me assombrando há alguns dias (é, me assombrar é a palavra certa). Que a Mariana falava para eu assistir, e que falou de novo quando pedi o endereço dela pro lançamento do livro: Beleza Roubada. E eu prometera pegar quando passasse perto da locadora. E devolver? Ah, eu não sabia, mas no dia seguinte, hoje, um novo e bom acontecimento me daria a chance de devolver o filme - tudo na mesma viagem...
Então fui direto na prateleira, peguei o filme, paguei e fui cortar cabelo. Duas conseqüências fortes de assistir o filme: descobri que aquela música que eu tanto gostava e não sabia o nome, da fitinha, era "2wicky" (Hooverphonic)... e a outra? A outra foi uma notícia que me contaram hoje de manhã e só depois de um tempo a grande coincidência me bateu... eu estava com a fita na mochila na hora... e ainda bem que não mostrei pra ninguém, putz.
Hoje consegui também realizar o projeto de me pendurar de cabeça para baixo num parquinho pensando em Velvet Underground. O parquinho que eu escolhi foi simples questão de impulso. E o que eu vi quando me deixei cair? Vi, ao centro do quadro, um salgueiro magnífico cuja copa verdíssima tocava a base azul-e-branca do meu campo de visão. Por trás do salgueiro, passavam carros coloridos na via expressa em alta velocidade. E por fim eu vi... estrelas. Os ossos soltos dentro da minha perna, aquela dor, aquela estranheza. Ouch. Os adultos me olhavam aquela louca que parara ali sua bicicleta e agora segurava a perna inutilizada, como a de Roberto Carlos, mas felizmente não por muito tempo. O negócio é achar maneiras de diminuir essa dor, pensei, enquanto montava na bicicleta, sabendo que o chão é pior para meus ossos periclitantes. Pedalar serve.
Eu disse que ia ser bom pro livro, eu disse.