28.9.05

O apartamento de Francisco é antigo. De seu quarto ele vê estrelas. Da varanda ele vê partes de edificações beges e brancas, ouve ruídos de crianças em playgrounds e divisa uma ou outra planta decorativa. Quando ele volta da varanda até o seu quarto, passa pela porta do outro quarto. Quando o sol se põe, deixa a varanda e a sala alaranjadas. A janela do outro quarto dá para o poço de ventilação. Seu vizinho é next door mesmo. Do banheiro se ouve tudo o que se fala na suíte do quarto de Francisco.
Fiz a planta para saber se isso existia mesmo ou era Escher.

As coisas esdrúxulas que uma pessoa faz quando escreve um livro. Devo ser das pessoas menos preocupadas com coisas como exatidão e verificação "científica": se exercesse mesmo o jornalismo, eu teria que me forçar a ser atenta ou viveria nas erratas até ser despedida. Só fiquei curiosa para saber se tinha inventado algo plausível.
Apenas um detalhe era arquitetonicamente improvável: o outro quarto dar para o poço de ventilação. Apartamentos antigos são bem mais generosos: um quarto de frente prum poço de ventilação seria algo impensável. Agora este quarto dá para a parede, pronto.
Também descobri que o apartamento de Francisco é de fundos e seu quarto é lateral.

Cheguei a pesquisar normas da ABNT:
"Nos últimos anos, tem renascido o interesse na promoção das boas práticas de projeto de iluminação natural por razões de eficiência energética e conforto visual. O uso otimizado da luz natural em edificações usadas principalmente de dia pode, pela substituição da luz artificial, produzir uma contribuição significativa para a redução do consumo de energia elétrica, melhoria do conforto visual e bem-estar dos ocupantes. A luz natural possui uma variabilidade e qualidades mais agradáveis e apreciadas que o ambiente proporcionado pela iluminação artificial. Aberturas, em geral, proporcionam aos ocupantes o contato visual com o mundo exterior e permitem também o relaxamento do sistema visual pela mudança das distâncias focais. A presença da luz natural pode garantir uma sensação de bem-estar e um relacionamento com o ambiente maior no qual estamos inseridos."
Dado que o livro tem gente trocando o dia pela noite e vedando as janelas com papel-cartão preto, achei uma certa graça.