17.4.06

Agora vou ser poética.
Quando você olha para o poente, especialmente de um lugar que, com moldura, daria um bom cartão-postal, você nota que você não consegue apreender as mudanças mínimas de tom que, a cada milésimo de segundo (ou pentelhésimo), tornam o quadro geral de rosa cada vez mais pra vermelho. E de vermelho pra roxo. E de roxo pra preto.
Você só consegue registrar essas "fotografias" de estágios sucessivos, cada vez mais escuros.
Como na situação do Rio, o tempo passa - e temos favela, mais favela, tiroteio em favela, polícia subindo favela, traficante aliado a policial, narcotraficante elegendo representantes, traficante fechando comércio, tiroteio em praça pública (o primeiro, na Praça Saens Peña), "Cidade de Deus", passeatas pela paz, faixas de "basta" nas varandas dos ricos, os políticos cada vez menos realizadores e cada vez mais eleitoreiros, roubo de rifles, exército subindo favela, assaltante invadindo prefeitura, e daqui a pouco somos a Colômbia e ninguém sabe como chegamos nessa.
Não sei se algum dia alguém - de baixo pra cima ou de cima pra baixo - vai algum dia pôr as mãos nas cadeiras e decretar: "ah, tá bom. Agora chega.". Como se não tivesse chegado antes. Ninguém parece estar tentando a sério. E quando decidirem (precisarem!) tentar, vai ser tarde demais para chegar numa solução comedida e tenho medo do que pode vir. O yeah, tenho medo.
Não concordo com as dondocas, não acho que o morro vá "descer". Esta pitonisa de araque divisa outro cenário: as drogas sintéticas começam a predominar, a classe média começa a dominar o tráfico e o morro, revoltado, começa uma onda de assaltos/arrastões/seqüestros tentando retomar o prejuízo. Pode haver algum lider messiânico nessa bagunça, de um ou dois ou mais lados. Os políticos, acuados, vão rapar suas contas em paraísos fiscais e fugir todos para Miami (como aconteceu na Springfield dos Simpsons um episódio aí). Eu não vejo Rosinha Garotinho nem Cesar Maia "afundando com o navio", de jeito maneira. Você vê?
Falta honra, caráter, dignidade, brio, respeito. Faltam todas aquelas palavras que adoramos usar em pulseiras de borracha e camisas justinhas.